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Amechanon, Vol. I / 2016-2018, ISSN: 2459-2846
Desdobramentos de um encontro com a infância para pensar um problema presente
Esse mesmo dia, de noite, um de nós, Walter ia fazer uma intervenção no Centro Cultural
Banco do Brasil no Centro do Rio de Janeiro, dentro do marco do evento «Três franceses,
uma alemã». Sua intervenção seria sobre Gilles Deleuze. Tinha preparado um escrito sobre
as relações entre filosofia, política e educação a partir de três linhas que atravessariam
esses três campos: invenção, resistência e solidão. A primeira linha (invenção) é uma
espécie de contra-tradição à construída a partir da alegoria da caverna de Platão, uma
contra-alegoria da caverna. Um trocar de plano e de problema e parar de pensar «novas»
estratégias para uma «velha» forma de pensar uma política para educação. Deixar de se
perguntar como formar as novas gerações e os que formarão os recém chegados, deixar
de pensar o sentido político da educação a partir de um educador iluminado que tiraria das
sombras aos educandos e, tirando a educação do plano da formação, coloca-la no plano da
criação, da invenção. No pensamento clássico, a educação é política por que permitirá
(num momento sempre deslocado, preterido, demorado, num mundo fantástico) fazer
realidade o possível, aproximar o que é do que deve ser, realizar a utopia através da
formação das novas gerações. Mas se não há outro mundo fora deste mundo, se só há
imanência, então o possível só pode vir da força criadora deste próprio mundo. Em vez de
pensar a educação como passagem do real ao possível, uma outra política da educação
teria a ver com, de forma inventiva, atualizar os possíveis já (virtualmente) reais.
A segunda linha afirma o papel da resistência na educação, como na arte e na filosofia. Se
o papel da arte é o de resistir no sentido de se contrapor (como sugere Primo Levi, segundo
aponta Deleuze) à vergonha de ser homem, à vergonha que nos mostram os desesperados
migrantes de Oriente Médio que estão chegando a qualquer preço e a qualquer custo a
Europa; entre nós, à vergonha das chacinas, lavas-jatos e saúde e educação pública nossas
de cada dia, não poderia o papel do educador ser também o de um resistente? E não seria
também esse o sentido da educação para quem aprende? qual é o lugar da resistência nas
vidas educadoras? A que se resiste ensinando e aprendendo? Que forças afirmativas uma
vida educadora inventa resistindo? Que proliferações da vida afirmam os atos de aprender
e ensinar? O que cria, o que inventa, por fim, um educador, assim como um filósofo cria
conceitos, um artista perceptos e uma cientista funções? O que significaria resistir
afirmativamente através da posição de um educador?
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