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Amechanon, Vol. I / 2016-2018, ISSN: 2459-2846



                   Uma dessas técnicas recebe o nome de «Parem e Pensem». Boal a apresenta do seguinte
                   modo: haveria uma desproporção enorme, a favor da primeira, entre a atividade cerebral

                   e a capacidade humana de exteriorizá-la. Em outras palavras, pensamos muito mais da
                   capacidade que temos de expressar esse pensamento. Em palavras de Boal:


                          «Nossos sentidos funcionam de forma permanente: percebemos constantemente
                          o  que  tocamos,  sentimos  permanentemente  o  cheiro  que  respiramos,  nossos
                          ouvidos não deixam de escutar, nosso paladar detecta sabores e, mesmo com as

                          pálpebras fechadas, nossos olhos continuam sempre a ver através dos olhos da
                          lembrança.  Essas  sensações,  presentes  ou  memorizadas,  continuam  a  nos
                          emocionar, com intensidades variáveis, as vezes imperceptíveis. Elas fazem com
                          que  pensemos,  e  pensamos  com  a  velocidade  do  relâmpago.  Experimentamos

                          centenas de pensamentos por segundo; o pensamento é veloz e indomesticável.
                          Evidentemente,  não  temos  capacidade  para  traduzir  em  palavras  todo  esses
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                          pensamentos» .

                   Existe uma teoria do corpo, das sensações e do pensamento posta em jogo. O pensamento

                   se alimenta dos sentidos. Os sentidos provocam pensamentos. O pensamento é veloz,
                   vertiginoso. A palavra, mais demorada, jamais alcança aquela velocidade. Por tanto, o ser

                   humano fica aquém na expressividade do seu pensamento. Ele pensa muito mais e a uma
                   velocidade muito maior daquela que é capaz de expressar o que pensa. Nesse contexto, o

                   teatro pode ser um espaço para que esses pensamentos ocultos, impossibilitados de se
                   manifestar através da palavra, encontrem lugar na superfície do mundo. Note-se que, se

                   compartilharmos  essa  ideia  do  ser  humano,  pensamento  e  expressividade,  onde  Boal
                   afirma «teatro» poderíamos dizer «filosofia» e a frase mantém um sentido interessante: a

                   filosofia poderia ser um espaço para colocar em palavras esses pensamentos ocultos, que
                   não alcançam a se manifestar. Para isso será necessário improvisar e deter a improvisação

                   quantas vezes seja necessário. Essa última frase, Boal a projeta para um diretor de teatro
                   mas também poderíamos estende-la a uma educadora filosófica.


                   No exercício, o Diretor opera como uma espécie de professor: propõe uma improvisação
                   e fica atento aos movimentos dos improvisadores. Cada vez que ele suspeite que encontra

                   um  gesto  que  esconde  coisas  ocultas,  ou  seja,  pensamentos  que  não  estão  sendo
                   expressados,  ele  dirá  «Pare!»  e  os  participantes  da  improvisação  irão  congelar  seus



                   88  Boal, A., op.cit., p. 73.



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